Capaz de cortar através de realidades políticas que pareciam intratáveis, enquanto focava a sua luz naqueles que pareciam ser os recantos mais negros da condição humana
Pouco depois da morte do Papa João Paulo II, no dia 2 de abril de 2005, Henry Kissinger disse à BBC News que seria difícil imaginar alguém com maior impacto no século XX do que o padre e bispo polaco que, na noite da sua eleição em 1978, descreveu-se como um homem que havia sido chamado para Roma a partir de um ‘’país longíquo’’. A avaliação de Kissinger é mais notável ainda pelo facto de que o antigo Secretário de Estado dos EUA – ele próprio uma figura controversa da história moderna – não se ter cruzado filosofica ou religiosamente com a vida, pensamento e ação de Karol Józef Wojtyla. Uma década e meia mais tarde, vale ainda a pena ponderar o que poderia significar o tributo extraordinário de Kissinger. Porque seria então que o Papa João Paulo II teria sido a figura mais emblemática do século XX? Qual foi a relação entre os feitos do Papa polaco – tanto para a Igreja como para o mundo – e a virtude heróica que a Igreja Católica lhe reconheceu formalmente, aquando da sua canonização enquanto São João Paulo II a 27 de abril de 2014?
Numa conversa no apartamento papal em março de 1996, João Paulo II disse, a propósito de tentativas anteriores de biógrafos de contar a história da sua vida, ‘’Eles tentam compreender-me a partir de fora. Mas eu só posso ser compreendido a partir de dentro.’’ Ele sabia que era uma figura de importância histórica. No entanto, a sua história, insistia, era uma que só podia ser lida a partir do interior do prisma da sua alma, caso aqueles que procurassem entendê-lo a si e à sua obra quisessem realmente perceber aquilo que o motivava. Assim, no vigésimo aniversário da publicação de Witness to Hope, revisitar a alma de São João Paulo II irá enquadrar propriamente a história da sua vida até o ano 2000. Karol Wojtyla, o homem que veio a ser João Paulo II, tinha uma alma intensamente polaca: não apenas no sentido de uma personalidade formada por uma experiência étnica em particular, mas no sentido mais lato de uma alma formada por uma história e cultura distintivas. Nascido em 1920, é membro da primeira geração de polacos nascidos num estado polaco independente desde o final do século XVIII; mas foi a experiência nacional polaca entre a eliminação da Polónia do mapa da Europa em 1795 e a restauração da independência em 1918 que foi decisiva na formação da alma de João Paulo II. Pois durante esse 123 anos no deserto – anos em que a Polónia não apareceu em qualquer mapa da Europa – a Polónia-nação sobreviveu à viviseção da Polónia-Estado através da sua cultura: a sua língua, a sua literatura e a sua fé católica.
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Não nasceram nem dependem de leis políticas, nem muito menos dependem das decisões pessoais dos seus titulares. Existiram desde sempre, ainda que não reconhecidos pelas leis e pelos reis
Parece que, neste apressado debate público sobre a questão da eutanásia, há juristas que defendem que os direitos humanos não são absolutos, porque são re- nunciáveis. Como vem da jurisprudência e da ciência política de tempos muito antigos, «ab-soluto» quer dizer direito que não está sujeito à lei. Ora, actualmente, o positivis- mo jurídico (que, dito em palavras simples, defende que a lei positiva é que cria politi- camente a justiça e o direito) já não goza de credibilidade, no contexto dos grandes progressos teóricos, filosóficos e jurídicos do constitucionalismo moderno.
Se os direitos humanos estivessem debaixo da lei, ainda que só da lei cons- titucional, então não seria preciso chamar-lhe «humanos»; bastaria chamar-lhe direitos constitucionais. Nem faria sentido dizer, como dizem as declarações americana e francesa de direitos dos fins do séc. XVIII, que são inatos, invioláveis, inalienáveis.