Guilherme d’Oliveira Martins
Conselho de Administração, Fundação Calouste Gulbenkian; Conselho Editorial, Nova Cidadania
José Mattoso foi um profundo renovador da moderna historiografia em Portugal
Ao falar de identidade nacional, José Mattoso lembra a anedota que se contava do rei D. Luís quando, já bem adiantado no século XIX, perguntava do seu iate a uns pescadores com quem se cruzou se eram portugueses e a resposta foi bem clara: “Nós outros? Não, meu Senhor! Nós somos da Póvoa de Varzim”. Com efeito, é sempre complexo o processo de definição do que designamos por identidade nacional. Ela é inseparável de uma perceção coletiva. Por isso a consciência histórica é fundamental, correspondendo à noção de apropriação do poder, tendo no caso de Portugal o Estado precedido a Nação, num processo lento e gradual. Esta anedota serve para se perceber que, longe de um entendimento fechado, estamos perante uma realidade complexa e aberta, que no caso português se traduz num curioso cadinho que, na diversidade, se uniformizou no território, na fronteira, na língua e numa construção convergente realizada de norte para sul e de sul para norte. “A História-escrita não será nunca reprodução da História-vivida” – disse-o José Mattoso (cf. A História Contemplativa – Ensaio, Temas e Debates, Círculo de Leitores, 2020). “A História-escrita não será nunca reprodução da História-vivida. Uma verifica os vestígios deixados pelo que aconteceu e relaciona-os entre si para representar o que já não existe. A outra é o conjunto dos próprios acontecimentos, que se sucedem no tempo e por isso podem ser recordados por quem os viveu, mas já não existem. Ao escrever a História construímos uma representação, ou seja, uma réplica do que aconteceu. Com efeito, os acontecimentos deram-se em momentos fortuitos, que não podemos representar porque a cada um deles segue-se outro momento”. A História-escrita não explica a reação dos poveiros. E para o historiador o encadeamento dos factos corresponde a operações mentais. Daí a necessidade de sínteses, de classificações, de agrupamentos racionais. Contudo, perante a complexidade temos dificuldade em distinguir o individual e o coletivo, o nacional e o internacional, os fatores sincrónicos e diacrónicos. Assim, a organização do tempo revela-se importante não apenas para distinguir a sucessão dos acontecimentos, mas também para permitir a comparação com o que ocorre noutros horizontes e que converge e diverge entre si. Como há um movimento permanente e simultâneo da sociedade humana, só podemos situar-nos na razão de ser das coisas a partir das referidas operações mentais.
Norbert Lammert
Presidente da Fundação Konrad Adenauer
Ex-Presidente do Bundestag alemão
A estabilidade de um sistema democrático não assenta no papel de uma constituição bem escrita, mas na determinação dos seus cidadãos em levar a validade da constituição e das suas regras ainda mais a sério do que os respectivos objectivos e interesses individuais
Boa noite, senhoras e senhores, Senhora Presidente, Senhora Reitora, Excelências, Frau Botschafterin, querido Herr Gruber, caros alunos, ilustres convidados,
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer muito pelo gentil convite para participar nesta prestigiada conferência e pela particular honra de concluir os discursos, painéis e debates dos trabalhos deste ano. O meu entendimento do meu trabalho esta noite, tendo em conta o programa, é que se espera que eu preencha os minutos restantes entre pensar, comer e dançar com algumas observações duradouras sobre a democracia. E como podem imaginar, esta é uma situação bastante inconveniente, porque dada a complexidade do tema da conferência, “Rebuilding Democratic Consensus at Home and Abroad”, o tempo disponível é muito limitado. Então, espero que gentilmente me sigam na minha abordagem insuficiente.