• +351 217 214 129
  • Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.

Liderança, Empreendorismo e Compromisso


Capa do Livro Alfredo da Silva e a CUF:

Estamos perante um livro que retracta, com invulgar rigor e particular objectividade, a personalidade, o percurso, e as realizações do maior industrial português de todos os tempos.

José Miguel Sardica
Alfredo da Silva e a CUF: Liderança, Empreendedorismo e Compromisso
Cascais, Principia, 2020

Manuel Braga da Cruz

Manuel Braga da Cruz

Professor Catedrático e antigo Reitor (2000-2012) da Universidade Católica Portuguesa. Membro do Conselho Editorial de Nova Cidadania

O livro que a Fundação Amelia de Mello encomendou ao Prof. José Miguel Sardica sobre Alfredo da Silva é uma obra de divulgação, destinada ao grande público, e muito em particular ao público das escolas portuguesas, para as quais foi lançado um concurso de trabalhos sobre a figura do grande industrial português de finais do século XIX e primeira metade do seculo XX.

Só um grande historiador, e um ex- perimentado académico, seria capaz de responder tão perfeitamente ao que se desejava, ao redigir uma excelente síntese descritiva mas também analítica, da vida, da obra e do legado de Alfredo da Silva. Estamos perante um livro que retracta, com invulgar rigor e particular objectividade, a personalidade, o percurso, e as realizações do maior industrial português de todos os tempos, deixando compreender as con- dições que permitiram a continuidade e engrandecimento do complexo da CUF até às nacionalizações de 1975, e o renascimento do grupo, após o regresso ao país da família, até ao presente.

O livro, para além de uma notável introdução e de uma brilhante conclusão, percorre precisamente as fases desta evolução histórica. No primeiro de cinco capítulos, descreve as origens familiares de Alfredo da Silva, o seu percurso escolar, e os primeiros tempos de actividade, até se tornar líder da CUF. Passa, num segundo capítulo, a recordar as vicissitudes de implantação e crescimento do maior grupo industrial português durante os últimos anos da Monarquia e os da primeira República, até ao Sidonismo, em que Alfredo da Silva se envolveu. Conta-nos num terceiro, o que foi o exílio a que foi forçado depois dos atentados de que foi vítima, até 1927, para, num quarto capítulo subsequente, se ocupar das suas relações com o Estado Novo de Salazar, até à sua morte, em plena II Guerra Mundial. Seguidamente, em dois capítulos, fala-nos da evolução da CUF até ao fim do regime e às nacionalizações da revolução de 1974, e da reconstrução e evolução do grupo após o regresso a Portugal, em pleno regime democrático, até ao presente.

A síntese realizada pelo Prof. José Miguel Sardica incide, como o próprio autor enumera no sub-título da obra, sobre três facetas particulares da vida e obra de Alfredo da Silva: Liderança, Empreendedorismo e Compromisso. Três aspectos que constituem precisamente as três principais dimensões da cultura empresarial criada e legada por Alfredo da Silva e desenvolvida pelos seus sucessores, através das já quatro gerações familiares.

Alfredo da Silva foi efectivamente um líder empresarial, uma figura carismática que impressionou os seus contemporâneos – de que o testemunho de Fernando Pessoa é bem demonstrativo –, um patrão mobilizador, que sabia escolher criteriosamente os seus colaboradores, a quem dava formação e condições especiais de exercício das suas funções, desde os melhores engenheiros e técnicos de que se rodeava, até aos simples operários, com quem mantinha relações de proximidade, e que remunerava muito acima da média do país. Não foi apenas um gestor de estruturas e instituições, que multiplicou e integrou verticalmente, mas um condutor de pessoas. E foi-o em contextos históricos particularmente adversos, como explica bem José Miguel Sardica, marcados pela instabilidade política e pelas crises económico-financeiras, sem esque- cer a grande confrontação bélica mundial de 1914-1918.

Foi também um invulgar empreendedor, arrojado e destemido, capaz de enfrentar os mais graves riscos, visionário e inovador, que soube compreender as necessidades de industrialização de uma sociedade maioritariamente agrária que, quando nasceu Alfredo da Silva, ocupava 66% da população activa na agricultura e tinha apenas 1/6 de operários, de um país de industrialização lenta e tardia, sem “revolução industrial”, cujo atraso e decadência não deixaram de se agravar ao longo do século XIX. Alfredo da Silva foi o maior industrial português, e um dos maiores a nível mundial, que muito contribuiu para a modernização da sociedade portuguesa, que soube aproveitar as matérias-primas por explorar, reunir os técnicos e as tecnologias de que o país carecia, responder às carências de produ- tividade dos vários sectores da economia nacional, articulando sectores de produção e de comercialização, suprindo com resposta nacional e empresarial as necessidades do ciclo económico.

Alfredo da Silva foi também, como o demonstra José Miguel Sardica, um empresário de forte consciência social, que fez sua, e do grupo, a responsabilidade social da indústria, dando condições de vida e de trabalho a dezenas de milhares de trabalhadores, tornando-se assim no maior empregador nacional, antecipando a satisfação dos direitos sociais do trabalho, desde a educação à saúde, passando pela satisfação de necessidades culturais e desportivas.

Um invulgar empreendedor, arrojado e destemido, capaz de enfrentar os mais graves riscos, visionário e inovador, que soube compreender as necessidades de industrialização de uma sociedade sobretudo agrária

São precisamente estas três dimensões da personalidade e da obra de Alfredo da Silva, constitutivas da cultura empresarial que deixou, e foi continuada pelos seus sucessores, que fazem destas comemo- rações dos 150 naos do seu nascimento uma importante ocasião para relembrar e relançar na sociedade portuguesa a urgência de fomentar a iniciativa empresarial, de favorecer o empreendedorismo, de formar líderes empresariais e do trabalho, de reforçar a consciência da responsabilidade social das empresas, de promover a adequada reindustrialização, num modelo que não assente em baixo salários nem em baixas qualificações, mas que, pelo contrário responda às exigências de relançamento do crescimento económico português, da criação de riqueza colectiva, de formação de capital nacional, de angariação de dimensão empresarial para a competição internacional.

Quem ler esta biografia de José Miguel Sardica perceberá facilmente a actualidade de Alfredo da Silva, demonstrando – são palavras suas - “como se pode triunfar através do mérito e criar riqueza e valor para si e para (muitos) outros, contribuindo para tornar Portugal mais rico ou, se se quiser, um pouco menos pobre do que a geografia, os recursos naturais e as capacidades humanas ditaram à partida”. Alfredo da Silva foi, na opinião de um contemporâneo, citado por Sardica, “o mais genial de todos os industriais portugueses, que elevara com êxito e legara aos seus “o sonho belo de criação de um dos maiores e complexos aglomerados industriais do mundo [...] para bem de um país que definhava pelo seu baixo índice industrial” (21). Como José Miguel Sardica também conclui, Alfredo da Silva foi um “empresário de larga visão, dotado de uma arguta capacidade de prever necessidades do país, de inovar e de servir, ultrapassando lealmente concorrentes e sabendo utilizar (como todo o gestor tem de saber) os ventos conjunturais da política para benefícios dos seus negócios. Alfredo da Silva quase nunca parou de prosperar, vencendo dificuldades mais ou menos momentâneas (o seu impé- rio sofreu apenas uma crise grave, que foi aliás bancária e não industrial, no início da década de 1930). Entre os maiores segredos do seu sucesso esteve também a maneira como soube organizar as relações laborais entre si, como patrão, as chefias intermédias, que recrutou no que de melhor havia em Portugal ou no estrangeiro, e a massa laboral operária que o temeu, sem dúvida, que contra ele protestou e contra ele fez greves, mas que também tinha por ele um “temerário respeito”, pelo muitíssimo que a CUF fez em termos de obra de assistência social para os seus trabalhadores” 1.

Já possuíamos uma magnífica biografia sobre Alfredo da Silva, da autoria do Prof. Miguel Figueira de Faria, a que acrescentou outro livro sobre Alfredo da Silva e Salazar. Agora, passamos a dispor também de uma biografia mais curta, mais sintética, mas não menos esclarecedora da enorme obra e da imensa vida de Alfredo da Silva, que deve servir como exemplo aos vindouros, e muito particularmente aos presentes, de uma cidadania económica, que, a par da riqueza pessoal e familiar, contribua para a riqueza do país e para o bem estar de todos os portugueses.


1 Sardica, p.25


1000 Caracteres remanescentes


Please publish modules in offcanvas position.