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Diogo Freitas do Amaral - Uma Introdução à Política


Diogo Freitas do Amaral Uma Introdução à Política

É um livro que se lê com agrado e facilidade, com que se aprende, sobretudo a pensar a política, e que motiva à participação quer no debate, quer na vida política.

Diogo Freitas do Amaral
Uma Introdução à Política

Alêtheia Editores, Lisboa, 2010

por Manuel Braga da Cruz Manuel Braga da Cruz

Professor Catedrático e antigo Reitor (2000-2012) da Universidade Católica Portuguesa

Agradeço ao Prof. Diogo Freitas do Amaral o honroso convite que me dirigiu para vir aqui hoje apresentar este seu novo livro, escrito em colaboração com a Profª Maria da Glória Garcia e o Juiz Conselheiro Prof. Pedro Machete, seus antigos assistentes. Trata-se, como o título indica, de Uma Introdução à Política, destinada a todos os que pretendam inteirar-se dos mecanismos da vida política, das suas instituições, dos seus regimes e sistemas. Não é um manual universitário, com explanação de teorias e posições científicas contrastantes, embora seja um livro muito útil para estudantes de Ciência Política. Não é com efeito um livro escrito para alunos, embora estes o possam e devam ler com proveito, mas pensado e elaborado para um público muito mais alargado. É antes um manual cívico, que visa tornar mais perceptível a vida política, quer a protagonistas, quer a destinatários, e que, desse modo, pode contribuir para uma melhoria da participação democrática. Escrito “em linguagem acessível a todos, mas com rigor académico”, apresenta ao leitor, com invulgar clareza e limpidez conceptual, a política portuguesa, com espírito crítico, a suscitar juízo próprio do leitor, quando não mesmo controvérsia.

Desde que Trindade Coelho editou há cerca de um século o seu Manuel Político do Cidadão Português (1906), não conhecíamos entre nós uma publicação com estas características, destinada a facilitar o entendimento da política e a participação nela por parte dos cidadãos. Com uma diferença assinalável: desta vez não estamos perante uma tradução adaptada, mas perante obra genuína e original.

O autor está particularmente bem posicionado para publicar uma obra como esta, que recorre à ciência sem pretender ser académico, que procede à análise da vida política sem ser um livro de intervenção, que pretende introduzir o leitor nos meandros da actividade política, sem cair nem no carácter sumário e elementar, nem na confusa complexificação de algumas descrições e análises. O Prof. Freitas do Amaral, cuja clareza expositiva os seus alunos e leitores se habituaram a admirar, reúne o conhecimento científico da política – que estudou e ensinou como Mestre de Direito Público -, com a vasta experiência de dirigente partidário e de homem de governo, combinando a dimensão nacional do seu percurso político com a passagem por importantes instituições internacionais. O ter sido um construtor da democracia portuguesa, que aqui procura explicar aos portugueses, sem contudo ser responsável por muitos aspectos que a configuram hoje problematicamente, permite-lhe ser crítico e polémico, convidando os leitores a ponderar alternativas que se lhe afiguram mais aconselháveis. Domina o pensamento político, sobre cuja história se debruçou já em obra precedente, conhece jurídica e cientificamente a política comparada, cultiva a ciência da administração, e tem da vida política – quer da nacional quer da internacional - uma visão vasta e abrangente, que o qualifica particularmente para escrever uma obra como a que hoje é aqui apresentada.

Não se pense que é fácil escrever uma introdução. Só um domínio vasto e profundo da política permite apresentá- la sinteticamente, com comparações esclarecedoras e distinções particularizantes. É um exercício apenas ao alcance dos grandes mestres. Direi até que constitui um elevado risco, que o autor entendeu correr com amplo sucesso.

Felicito pois a Fundação Calouste Gulbenkian por possibilitar a realização, para um público alargado, de uma obra de esclarecimento e de questionamento como esta, e muito especialmente o seu administrador Prof. Marçal Grilo que tomou a decisão de a apoiar.

O autor podia ter feito o livro sozinho. Quis no entanto agregar dois dos seus antigos colaboradores que são hoje figuras eminentes da vida pública portuguesa, o que só vem comprovar a excelência do seu magistério, e demonstrar que fez discípulos e escola.

É um livro conciso, apesar da dimensão, bem escrito, com a clareza expositiva e lógica habitual no Prof. Freitas do Amaral, mas nem por isso menos rigoroso. O autor tem o condão pedagógico de saber explicar coisas complexas com enorme simplicidade e precisão, sem no entanto lhes retirar riqueza e dimensão problemática.

A obra consegue um equilíbrio notável entre a conceptualização universal e a exemplificação nacional. Não é apenas um livro de teoria, nem apenas um livro sobre a prática política portuguesa, mas uma simbiose feliz e harmoniosa entre ambas. A teoria é convocada somente e enquanto permite compreender a concreta política portuguesa. A história e o presente combinam-se para melhor esclarecer conceitos e formas políticas.

A política a que o autor nos pretende introduzir não é apenas a política institucional, centrada no Estado e na administração, embora esta ocupe uma posição muito ampla na obra, mas uma mais vasta perspectiva, que começa no poder nas sociedades e na sua necessidade.

O livro, bem estruturadoado, começa por onde começou aliás a Ciência Política: pela Teoria Geral do Estado. Partindo da origem e da evolução do Estado, analisa as principais formas históricas do Estado, os elementos que o constituem, os seus fins, as várias espécies de Estado, as suas funções, os seus poderes e os seus órgãos: a chefia do Estado, o parlamento, o governo e a administração pública. Dali passa às formas políticas (monarquia e república), aos regimes (democracias e ditaduras) e posteriormente aos sistemas de governo. Procede, de seguida, a uma ampla e muito feliz análise da dignidade humana, na sua relação com a Justiça, com a Paz, com a liberdade e a responsabilidade, com a solidariedade e a igualdade, da autoria da Prof. Maria da Glória Garcia. Aborda de seguida as classes sociais, os partidos e grupos de pressão, os sistemas eleitorais e a geografia eleitoral, a alternância democrática e o contraste entre a direita e a esquerda, para terminar com uma parte sobre a economia e a justiça social, e outra sobre a boa governação.

Não deixa de ser curioso que o autor não tenha abordado uma dimensão que, pela sua competência e experiência, poderia ter tratado como poucos: a política internacional e nela, especialmente, a dimensão europeia, aflorada de forma incipiente mas não muito desenvolvida.

Como é igualmente curiosa a inclusão de um capítulo sobre classes sociais, matéria tipicamente sociológica, abordada genericamente e sem grande explicação da sua relação com a restante matéria.

Algumas destas partes merecem do autor maior detenção, enquanto outras são tratadas mais brevemente. Nem todas as matérias são abordadas com o mesmo desenvolvimento: nalguns casos, a análise aprofunda-se, noutros referem-se apenas os elementos caracterizadores fundamentais. Não terá sido alheio a esta opção, não apenas o facto de o livro não poder atingir uma desmedida dimensão, mas também o facto de o autor, já anteriormente, se ter debruçado sobre algumas matérias aqui versadas, como aconteceu com a publicação em 1985 de Uma Solução para Portugal, livro programático, mas de inegável relevância analítica. Refirome, em especial, aos sistemas eleitorais, aos partidos e aos sistemas de governo.

Merecem particular destaque, pelo seu carácter pouco usual, em compêndios congéneres, as páginas dedicadas à Administração Pública e aos Tribunais, por um lado, e os capítulos sobre a dignidade humana e a cidadania, particularmente densos e claros. Não pode deixar de ter referência especial, também pelo seu aspecto inovador, a inclusão certeira das Universidades e da Comunicação Social entre os mais recentes grupos de pressão. Os últimos capítulos sobre a Economia e a Justiça, ou seja sobre os sistemas económicosociais, também eles uma novidade em introduções à política, são particularmente pertinentes, porque esclarecedores das grandes divergências programáticas e ideológicas das forças políticas, que não apenas das diferentes políticas públicas.

Não estamos perante um livro asséptico ou neutral. O autor não se furta a emitir opinião, a expressar a sua posição em matérias controvérsias, abrindo contudo para alternativas. Mas é simultaneamente um livro interrogante, que leva o leitor a questionar-se, a pôr problemas a si próprio e ao autor.

As oportunidades de o fazer são muitas: o chefe de Estado parlamentar será apenas um símbolo ou representante da unidade nacional (119)? O Rei D. Carlos terá sido um chefe de estado governante? Não foi o regime da Constituição de 1933, também ele, bicamaralista, se bem que assimétrico? Não terá sido o Conselho da Revolução uma Câmara Alta, até á revisão constitucional de 1982? Será o poder do semipresidencialismo moderador, se falta ao presidente a designação da Câmara Alta, apesar do direito de veto? Pelo facto de, por vezes, não haver eleição de todos os seus membros, poderá considerar-se a Câmara Alta não democrática? Poderá identificar-se todo o serviço público com a administração pública? A Democracia directa é democrática? Foi o sistema de Weimar semi-presidencialista? Deverá ser o Estado prestador ou garante dos direitos sociais? A sociedade civil é integrada apenas por cidadãos ou também por instituições? As classes são uma realidade e uma categoria social das sociedades industriais, ou existiram sempre? A representação proporcional facilita a formação de maiorias?

Eis algumas questões, entre muitas outras, que qualquer leitor pode formular, à medida que avança na leitura, provando que estamos perante um livro que suscita reflexão e indagação, e não perante um catecismo político, com receituário dogmático sobre os problemas. Longe de ser uma exposição catedrática, trata-se de um discorrer arrumado e claro sobre controvérsias e problemas, que convida a pensar e a opinar.

É um livro que se lê com agrado e facilidade, com que se aprende, sobretudo a pensar a política, e que motiva à participação quer no debate, quer na vida política. É por isso um compêndio, onde muito se reúne, para muito mais se olhar e compreender. Razão suficiente para felicitar e agradecer ao Prof. Freitas do Amaral mais este contributo para a qualificação da vida pública portuguesa, e para a construção de uma sociedade mais participada e responsável.


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