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Finanças Locais em Angola


 

Que factores determinam as dotações financeiras Intragovernamentais em Angola?

 

Carlos Pacatolo

Assessor do Administrador Municipal do Lobito, Angola

Que factores determinam as dotações financeiras Intragovernamentais em Angola? Ou porque algumas administrações municipais (nomeadamente as que são sedes provinciais e/ou da província de Cabinda, Zaire, Lunda Norte e Sul e Moxico) recebem mais recursos financeiros do governo central do que outras? Que problemas (potenciais) estão relacionados com o mecanismo actual de dotações financeiras intragovernamentais em Angola? Procura-se responder a estas questões à luz da Teoria do Federalismo Orçamental, onde se destacam autores como Oates, Shah e Boadway, Pereira et alii, entre outros.

Que factores determinam as dotações financeiras Intragovernamentais em Angola? Ou porque algumas administrações municipais (nomeadamente as que são sedes provinciais e/ou da província de Cabinda, Zaire, Lunda Norte e Sul e Moxico) recebem mais recursos financeiros do governo central do que outras? Que problemas (potenciais) estão relacionados com o mecanismo actual de dotações financeiras intragovernamentais em Angola? Procura-se responder a estas questões à luz da Teoria do Federalismo Orçamental, onde se destacam autores como Oates, Shah e Boadway, Pereira et alii, entre outros.

Síntese da Revisão de Literatura

Segundo Oates e Pereira et alii, enquanto subtema das finanças públicas, o federalismo orçamental aborda a estrutura vertical do sector público; explora, quer do ponto de vista normativo quer positivo, as atribuições e competências dos diferentes níveis de governo e a forma como eles se relacionam, financeiramente, através das transferências intergovernamentais em Estados federados e unitários.

Oates adverte que o uso económico do termo “federalismo” é, de certa forma, diferente do seu uso normal em ciência política, onde se refere a um sistema político com uma constituição que garante alguma escala de autonomia e poder para ambos os níveis central e descentralizado de governo. Para um economista, quase todo o sector público é mais ou menos federal, no sentido de ter diferentes níveis de governo que prestam serviços públicos e têm alguma margem discricionária de autoridade para, de facto, tomarem decisões (independentemente da constituição formal).

A abordagem tradicional da descentralização financeira assenta no teorema da descentralização, e postula o seguinte “na ausência de redução de custos da provisão centralizada de um bem (público local) e de externalidades inter - jurisdicionais, o nível de bem-estar será sempre, ao limite, tão alto (e, geralmente, mais elevado) se o nível de consumo eficiente no sentido de Pareto for fornecido em cada jurisdição, do que se for fornecido um padrão único e uniforme de consumo (bens públicos locais) para todas jurisdições (pelo governo central)”.

Fisher define as transferências intergovernamentais como “transferências de fundos de um governo para outro, frequentemente, do governo central para os governos locais. Estas podem ser de vários tipos, visando a melhoria do sistema financeiro dos governos federais.

Oates considera as transferências intergovernamentais como “um distinto e importante instrumento político ou de política no federalismo orçamental, podendo estas desempenhar inúmeras funções. Entre elas, destacam-se três em particular: internalização dos benefícios das externalidades para outras localidades (municípios), equilíbrio financeiro entre as localidades (municípios) e melhoria global do sistema fiscal”.

Pereira e Silva e Pereira et alii admitem três razões para existência das transferências intergovernamentais, sendo uma diferente de Oates: “1º equilíbrio financeiro horizontal entre autarquias do mesmo grau – com o objectivo de corrigir desigualdades na posição orçamental dos municípios; 2º equilíbrio financeiro vertical – com o objectivo de partilhar receitas fiscais que devem ser cobradas pela administração central, mas que deverão ser partilhadas por vários níveis de administração para adequar às competências respectivas de cada nível de governo; 3º e eficiência – pode passar por distorcer as escolhas municipais, de acordo com as preferências dos níveis de governo “superiores”, por levar a que os municípios considerem os efeitos externos benéficos que exercem em municípios limites, e finalmente para que haja uma comparticipação dos governos superiores em competências partilhadas entre vários níveis de administração”.

Entretanto, na sequência dos desenvolvimentos trazidos pelo “nova” literatura do federalismo orçamental ou teoria do federalismo orçamental de segunda geração”, começou-se a analisar os efeitos perversos das transferências intergovernamentais na disciplina orçamental dos governos regionais e locais. Os teóricos da “nova vaga”, Gamkhar e Shah, chegam a admitir que as transferências podem integrar-se numa estrutura de promoção da irresponsabilidade financeira e de instabilidade macroeconómica.

Rodden considera mesmo que “existem boas razões para se preocupar com o aumento da confiança (dos governos sub – nacionais) nas transferências intergovernamentais que pode gerar problemas de agência e de “common pool”, sobretudo quando os governos sub – nacionais têm acesso ao mercado de crédito e o governo central é politicamente fraco”. As crises orçamentais da Argentina e do Brasil, geradas por comportamentos desestabilizadores de governos estaduais/ regionais e locais, são invocadas como exemplo.

Existem alguns estudos aplicados a realidade dos países em vias de desenvolvimento como Prud’Homme, Boex, Inman e Rubinfeld, entre outros. Quanto a Angola existe um diagnóstico feito pelo PNUD em 2006, mas está muito desactualizado.

A desconcentração administrativa em Angola: competências dos órgãos locais do Estado

A desconcentração administrativa é entendida pelo legislador angolano como “o processo administrativo através do qual um órgão da administração central do Estado transfere poderes a outro órgão da administração local do Estado” .

As competências das administrações municipais agrupamse em dois blocos principais, serviços públicos essenciais: promoção da iluminação e sinalização rodoviária; manutenção, distribuição e a gestão da água e da electricidade (em zonas não cobertas pelas empresas públicas ligadas àqueles sectores); construção, manutenção, apetrechamento em mobiliário, material didáctico e manuais escolares das escolas primárias; recolha e tratamento do lixo; estabelecimento e gestão dos sistemas de drenagem pluvial; e a solidarieda- de social e mobilização sociocultural: aquisição e distribuição de insumos agrícolas em áreas rurais; programas de integração comunitária e de combate à pobreza; assistência social e sanitária; promoção de casas de cultura e bibliotecas municipais, bem como garantir o seu apetrechamento em material bibliográfico.

A realidade financeira local em Angola

O Decreto Presidencial nº 30/10 de 9 de Abril, sobre o “Regime Financeiro Local”, regula a arrecadação, elaboração, execução e prestação de contas dos orçamentos da administração local, nomeadamente os governos provinciais e administrações municipais, mas deixa em aberto a definição de uma fórmula para transferência de recursos financeiros intragovernamentais.

Os órgãos da administração local do Estado são considerados unidades orçamentais e, nesta condição, recebem dotações orçamentais do governo central para executar de acordo com as políticas definidas central e localmente. Estas dotações orçamentais são denominadas de “quotas financeiras” e a sua atribuição é feita com elevado grau de discricionariedade política dos órgãos de tutela.

Os municípios de regiões petrolíferas e diamantíferas são beneficiados financeiramente pelas receitas consignadas derivadas das receitas fiscais associadas à exploração daqueles recursos minerais, para além de terem acesso, como os demais municípios, a outras receitas consignadas. Esta situação agrava a disparidade fiscal orçamental entre os municípios angolanos.

Conclusão

No âmbito dos passos que estão a ser dados na desconcentração administrativa e financeira para capacitar e preparar as administrações municipais rumo as autarquias locais, procurou- se responder as questões de investigação em conformidade com os princípios da diferenciação e da transferência de recursos, previstos nas alíneas c) e d) do art.º4º da lei nº17/10 de 29 de Julho.

Assim, foi proposto “um modelo mais eficiente e justo de repartição de recursos financeiros intragovernamentais”. Este modelo tem como critério principal a dimensão populacional de cada município para o Fundo Geral (80% das transferências) e o grau de desenvolvimento socioeconómico -municípios com população abaixo de 80% da população do município sede - para o Fundo de Coesão (20% das transferências) a ser financiado por uma percentagem das receitas petrolíferas e diamantíferas consignadas. Resulta claro que o Fundo de Coesão, repartido de forma equitativa entre os municípios beneficiários, visa promover maior equidade entre as circunscrições administrativas.

O modelo inspira-se em J. Boex para a Tanzânia e de Pereira e Silva, com mais desenvolvimento em Pereira et alii, para Portugal. Procurou-se andar nos limites do decreto presidencial 30/10 sobre “Finanças Locais” para garantir-lhe alguma aplicação efectiva; contudo, as criticas feitas ao diploma, permitiram apresentar alguma inovação.

Por isso, o modelo visa garantir maior solidariedade territorial; maior estabilidade, previsibilidade, simplicidade e transparência às transferências financeira intragovernamentais; e minimizar a discricionariedade dos órgãos de tutela. Espera-se que os membros dos conselhos municipais de concertação social, mesmo sem elevados conhecimentos de estatística e de economia, possam facilmente servir de agentes fiscalizadores da aplicação do modelo a nível local, bem como os restantes membros da sociedade civil.

Finalmente, ao alterar o status quo do poder discricionário e dos municípios que perdem recursos financeiros, poderá encontrar alguma resistência na sua aceitação e aplicação. O equilíbrio de forças entre os que perdem muito com a alteração do status quo e os que beneficiam ditará a utilidade prática deste modesto contributo. Ainda assim, julga-se que o modelo é preferível à situação actual.

Trabalhos futuros deverão ter em conta o nível de intervenção dos governos centrais e provinciais nos municípios angolanos para avaliar se a sua repartição tende a ser pro-rico (urbano) ou pro-pobre (rural). A produção de dados estatísticos sobre a realidade socioeconómica e demográfica dos municípios e províncias angolanas é um desafio urgente que precisa ser vencido no curto prazo, para minimizar as dificuldades com que se depara qualquer investigação científica que se quer séria.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • Boex, James, Editor (2003), Final Report: Developing a System of Intergovernmental Grants in Tanzania, George State University-Andrew Young School of Policy Studies;
  • Fisher, Ronald C. (2007), State and Local Public Finance, Third Edition, Thomson South-Western;
  • Gamkhar, Shama & Shah, Anwar (2007), “The Impact of Intergovernmental Fiscal Transfers: a Synthesis of the Conceptual and Empirical Literature”, In Boadway, Robin & Shah, Anwar, Editors (2007), Intergovernmental Fiscal Transfers, Principles and Practice, Public Sector Governance and Accountability Series, The World Bank, Washington, DC, pp.225 -258;
  • Oates, Wallace E. (1999), “An Essay on Fiscal Federalism”, Journal of Economic Literature, Vol. 37, 3: 1120-1149;
  • Oates, Wallace E. (2005), “Toward a Second – Generation Theory of Fiscal Federalism”, International Tax and Public Finance, 12: 349-373;
  • Rodden, Jonathan (2002), “The Dilemma of Fiscal Federalism: Grants and Fiscal Performance around the World”, American Journal of Political Science, Vol. 46, 3: 670-687;
  • Rodden, Jonathan (2003), “Reviving Leviathan: Fiscal Federalism and the Growth of Government”, International Organization, Vol. 57, 4: 695 -729; 
  • Pereira, Paulo Trigo & Afonso, António & Arcanjo, Manuela & Gomes Santos, J. C. (2009), Economia e Finanças Públicas, 3ª Edição, (Lisboa: Escolar Editora);
  • Pereira, Paulo Trigo & Silva, João Andrade e (2001), “Subvenções para os Municípios: Um Novo Modelo de Equilíbrio Financeiro”, Notas Económicas

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