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Olhos azuis / Olhos castanhos


 

 

O prémio Nobel da paz de 1964 Martin Luther King Jr foi assassinado em 4 de Abril de 1968.

 

POR JOSÉ EDUARDO GONÇALVES LOPES

DOUTORANDO NO INSTITUTO DE ESTUDOS POLÍTICOS DA UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

A professora Jane Elliott da 3ª classe de Riceville, Iowa, uma pequena cidade de brancos, não sabia como explicar aos seus alunos porque haviam morto a pessoa que eles tinham considerado, em Fevereiro, o seu “Herói do Mês”. Com os miúdos a concordar que se deve tratar os outros “como tu gostas que te tratem”, como se eles “fossem o teu irmão”, a professora Elliott perguntou-lhes se havia alguém que não era tratado assim. “Os pretos, os índios, as pessoas de cor diferente” responderam os alunos.

“Como é que vocês acham que é ser uma pessoa de cor diferente”, questionou a professora. Resolveu então mostrar-lhes como é a discriminação, o que esta faz às pessoas.

Assim nasceu o exercício “Olhos azuis/Olhos castanhos” (“Blue Eyes/Brown Eyes”), numa aula em que os cerca de 30 alunos foram divididos pela cor dos olhos, os meninos com olhos azuis e os meninos com olhos castanhos.

No primeiro dia, a professora Elliott disse aos miúdos de olhos azuis que eles eram mais espertos, mais bonitos, mais limpos e melhores do que os de olhos castanhos. Durante todo o dia a professora elogiou-os, concedeu-lhes privilégios (ser os primeiros na fila do almoço, ter 5 minutos extra de recreio) - enquanto que os meninos de olhos castanhos, para além de terem de usar um colarinho, viram os seus comportamentos e resultados criticados e ridicularizados.

No dia seguinte, os papeis inverteram-se, com os miúdos de olhos azuis a serem considerados os “inferiores” em relação aos de olhos castanhos.

Os resultados dos dois dias do exercício foram surpreendentes: as crianças que foram consideradas “inferiores”, comportaram-se efectivamente como verdadeiras pessoas que se sentiam “inferiores”, com fracos resultados nos exercícios escolares; em contraste, os alunos “superiores” tiveram atitudes de arrogância em relação aos outros miúdos. Isto, apesar de todos as
crianças saberem perfeitamente que se tratava de um jogo.

É de salientar que em nenhum momento Jane Elliott disse às crianças para tratarem de forma diferente os colegas que estavam na posição de “inferiores”; limitou-se a dizer-lhes que eram diferentes.

A professora Jane Elliott constatou que miúdos maravilhosos, cooperantes, atenciosos, se tornaram, em 15 minutos, maus, viciosos, arrogantes em relação aos colegas e amigos - concluindo que tinha sido criado um microcosmo da sociedade numa sala de aula. Ou seja, as crianças assumiram as atitudes características da discriminação, tanto as que discriminaram, como as que sofreram a discriminação.

A experiência “Olhos azuis/Olhos castanhos” levou a que Elliott fosse convidada do programa “Tonight Show” de Johnny Carson. As reacções da audiência, em centenas de telefonemas,
traduzirem-se em censura: “como te atreveste a experimentar aquela crueldade com crianças brancas; as crianças pretas crescem habituadas a tal comportamento, mas as crianças brancas não conseguem compreendê-lo. É cruel para as crianças brancas e vai causar-lhes graves danos psicológicos”. Jane Elliott repetiu este exercício em 1969 e em 1970. Este foi filmado para a “ABC News”, sendo emitido com o título “Eye of the Storm”.

Em 1985, a PBS/FRONTLINE emitiu o documentário “A Class Divided” que documenta o reencontro de 11 ex-alunos da 3ª classe de 1970 com a sua ex-professora Jane Elliott, em Agosto de 1984, em que vêem o registo de 1970 e discutem o resultado do exercício para as suas vidas, no que toca ao preconceito, e concluem que o mesmo devia ser repetido por alunos e professores - sentir o que é ser discriminado. O mesmo documentário, mostra ainda uma lição de Jane Elliott aos empregados do sistema prisional de Iowa, e a reacção destes muito similar à das crianças de 1970.

O documentário “Olhos Azuis” mostra um workshop em que Jane Elliott aplica a adultos o exercício “Olhos azuis/Olhos castanhos”, exercício que respeita a todos os tipos de discriminação, e não só à discriminação racial. Verdadeiramente, o exercício traduz-se em “pôr-se na pele dos outros, para compreender a situação em que se encontram”.

O ‘pôr-se na pele dos outros’ parece ser uma prática aconselhável, tanto mais que, de acordo com o Eurobarómetro (https://www.europarl.europa.eu/at-your-service/pt/be-heard/eurobarometer), em 2008, os portugueses tiveram a seguinte percepção em relação aos tipos de discriminação: orientação sexual - 65%, étnica - 60%, deficiência - 55%, idade - 51%, sexo - 43%, religião ou crença - 36%.

Todos os que têm a responsabilidade de resolver as situações de discriminação deveriam começar por se ‘pôr na pele dos outros’.

Os filmes “A Class Divided” e “Blue Eyed” dão uma preciosa ajuda!

 

 

A Class Divided

FILME “A Class Divided”Documentário, 1985, 46 minutos,
emitido pela PBS/FRONTLINE, em 26 de Março de 1985
in YouTube, referência “Class Divided (1 of 6)”; também em https://www.pbs.org/wgbh/frontline/documentary/class-divided/

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FILME “Blue Eyed”Documentário, 1996, 93 minutos
Documentário, 1985, 46 minutos, emitido pela PBS/FRONTLINE, em 26 de Março de 1985
in YouTube, referência “Olhos Azuis - 01” (até 12) (com legendas em português)


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