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Obituário José-Augusto França: Pedagogo exemplar

Guilherme d'Oliveira Martins

Guilherme d'Oliveira Martins

Conselho de Administração, Fundação Calouste Gulbenkian; Conselho Editorial, Nova Cidadania

Quando tive a notícia de que José-Augusto França partira, veio-me à memória essa tarde inesquecível e irrepetível – a lembrança do prazer verdadeiro em conversar, como troca livre de ideias.

Jamais esquecerei a tarde em que, na Biblioteca Municipal de Tomar, no Bibliotecando, em maio de 2016, José-Augusto França e Eduardo Lourenço se encontraram para debater “Os Outros e Nós”. Com o método desafiante habitual (lembremo-nos do ensaio de Unicórnio), o ensaísta de “A Nau de Ícaro” referiu aos seus ouvintes: “A Europa nunca existiu, nem sei se alguma vez existirá como ator dela mesma”. Afinal, os países que habitam este espaço comum sempre estiveram a braços com “uma espécie de guerra civil permanente, desde os Romanos, até hoje praticamente”, na medida em que cada uma das nações com maior poder, foi à vez, tentando dominar as outras para hegemonizar o continente... As ideias foram-se desfiando e chegado o ponto de J.-A. França falar usou o tom irónico, que lhe era habitual, afimando que “nós somos sempre os outros. É algo reversível e reflexo. Contudo sendo sempre os outros nós, temos de ter muito cuidado com os outros, naturalmente, e esse cuidado nós não temos tido”. Em nome desse cuidado, lembrou que o Grémio Literário, a cujo Conselho Literário então presidia, foi a única instituição que assinalou e debateu a conquista de Lisboa pelos mouros em 713, lembrando que “a língua portuguesa é a única falada na Europa que usa todos os dias uma palavra ‘o oxalá’ (se Deus quiser), ou seja nós estamos a falar árabe sem dar por isso, e vivemos muito bem e muito pacificamente. Em suma, nós somos sempre os outros”. O diálogo que se estabeleceu nessa tarde, prolongou-se na viagem que fizemos juntos entre Tomar e Lisboa. Foi animada a conversa, entre a per- plexidade pela intolerância na cena internacional e a lembrança de episódios passados, entre enganos e genuínos encontros inesperados, a ilustrar o difícil tema que nos levou de Almada Negreiros, “Português sem Mestre” até Mário de Sá-Carneiro e a Bernardo Soares, já que identidade e alteridade são palavras que alternam e coexistem sempre...

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