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A Marinha em África Angola, Guiné e Moçambique: Campanhas Fluviais 1961-1974


A Marinha em África Angola, Guiné e Moçambique: Campanhas Fluviais 1961-1974

Não é comum encontrar-se um prestigiado académico norte-americano interessado em investigar as últimas campanhas militares portuguesas em África e, para mais, com o intuito de utilizar o resultado do trabalho como um case study.

A Marinha em África
John P. Cann

Prefácio, 2009

POR NUNO VIEIRA MATIAS

Professor convidado do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa

Mas foi o que aconteceu com o Professor John Cann, o qual, após 15 anos de estudo, continua a classificar o estudo do nosso esforço militar em África como valioso pelas lições que permite extrair, de interesse actual e futuro para outras forças armadas.

O Prof. John Cann doutorou-se no King’s College de Londres onde, em 1996, apresentou uma tese sobre aquelas campanhas, que daria origem ao livro publicado no ano seguinte, nos Estados Unidos da América, Counterinsurgency in Africa: The Portuguese Way of War, 1961-1974.

No seguimento deste trabalho, o Autor aprofundou o conhecimento da acção da Marinha portuguesa, navios e fuzileiros, e editou, em 2007, no seu país, a obra Brown Waters of Africa – Portuguese Riverine Warfare, 1961-1974. Após tradução pela Prefácio, surgiu o livro agora aqui apresentado. Este académico, antigo oficial aviador da U.S. Navy, foi professor da Marine Corps University, lecciona actualmente na Virgínia University e é membro do International Advisory and Research Council no Potomac Institute for Policy Studies e do Institute for Defense Analyzes.

Os excepcionais méritos académicos do Prof. Cann permitiram a elaboração de um trabalho de invulgar valia, até pela isenção que o caracteriza e, por isso, acontece naturalmente a quase transformação do evento do lançamento do livro numa sentida homenagem. Na verdade, são até duas as homenagens. Uma, ao Autor dos trabalhos de pesquisa, análise e divulgação das campanhas portuguesas em África, de 1961 a 1974, o Senhor Professor John Cann. É um tributo que devemos a tão ilustre investigador, pelo trabalhado árduo, profundo, honesto e inteligente que vem desenvolvendo, visando fazer a história dessas nossas campanhas, um modelo, ainda útil nos dias de hoje, como escreve o Autor, exactamente na última frase do livro, que cito: “Claramente, o legado da Marinha portuguesa de águas interiores permanece relevante hoje e continua a influenciar o formato das marinhas actuais e futuras”.

A segunda homenagem salta, espontânea, da alma, sobretudo dos que tiveram a honra de servir em campanha, naquele período, quando lêem o livro A Marinha em África. É uma homenagem aos marinheiros que lutaram sobre a terra e sobre o mar e que bem “cumpriram sem cuidar recompensa”, como diz a divisa da Associação dos Oficiais da Reserva Naval (AORN). O respeito pela memória dos que tombaram de pé está bem patente em toda a obra do Prof. Cann.O livro A Marinha em África é uma notável obra que muito contribui para a história da Marinha, mas que tem também a sua história.

De facto, em 1995, pela mão do Senhor General Marques Pinto, o Prof. John Cann foi posto em contacto com este antigo marinheiro de Angola e fuzileiro da Guiné. Conversámos, aproveitando as escassas horas de uma tarde, no gabinete que eu ocupava de Superintendente dos Serviços do Material, até ao limite da sua ida para o aeroporto, de regresso a casa, nos EUA. Falámos de África, da Marinha, dos navios e dos fuzileiros, de Angola e da Guiné. Foi uma enxurrada de palavras e de ideias que o Prof. Cann teve a paciência de ir anotando. Fiquei de lhe mandar mais elementos pelo correio, o que fiz com a ajuda do Comandante do Corpo de Fuzileiros, Cte. Vasco Cunha Brazão.

Mais tarde, em 1997, por ocasião do lançamento em Lisboa do livro Counterinsurgency in Africa, conversámos, de novo, desta vez num novo gabinete, o do Chefe do Estado-Maior da Armada. E surgiu a ideia - porque não desenvolver a acção da Marinha num livro dedicado? Prometi abrir as portas e gavetas dos arquivos da Marinha e indicar pessoas capazes de darem testemunhos e apoios certos. O Prof. Cann aceitou o repto e muitas foram as pessoas que o apoiaram e que ele cuidadosa e gentilmente refere no seu “Agradecimento”, com especial sublinhado para a AORN.

Foi um trabalho duro, este, do nosso Autor. Duro, persistente e longo, pois foi preciso esperar dez anos, até Outubro de 2007, quando, inesperadamente, recebi uma carta dos EUA acompanhando o livro Brown waters of Africa. Nela, John Cann dizia: “I thought that it would never be completed but am proud to say that it now has been”.

O resto da história é bem conhecido.

O livro, em inglês, foi apresentado neste mesmo lugar, o ano passado, pela palavra do nosso saudoso Presidente Almirante António Sacchetti e, depois, traduzido e editado pela Prefácio. Espero, agora, que da primeira edição para a segunda seja também um curto passo.

Não quero deixar de fazer duas notas.

A primeira tem a ver com o notável enquadramento que o Autor faz das nossas campanhas, no ambiente político mundial da época, de plena Guerra Fria, marcado pela estratégia ocidental de “containment” do comunismo no seu espaço de origem. É uma visão ampla, ajudada pelos factos da história de Portugal, escritos também em África. E estes foram bem entendidos pelo Prof. Cann, como prova, ao escrever, por exemplo, e cito, “Portugal foi a primeira grande potência colonial a chegar a África e a última a deixá-la. Sendo um país pequeno, com escassos recursos, a sua longa permanência no continente africano justifica-se pela criatividade, adaptabilidade e afinidade com os territórios colonizados”.

A Marinha em África Angola, Guiné e Moçambique: Campanhas Fluviais 1961-1974

Cabe também nesta nota sobre o enquadramento referir a rara perspicácia do Autor quando aborda a visão estratégica da Marinha portuguesa, ainda nos anos 50, procurando preparar-se, por vezes contra ventos e marés, para um quadro de situação que se antevia. Inseriu-se nesse planeamento estratégico o desenho de uma organização com a conveniente estrutura de comandos no Ultramar e uma rede de comunicações, entre outras medidas, assim como se previu a recriação dos Fuzileiros, apesar de algumas miopias da altura, de resto ainda não totalmente curadas hoje.

A segunda nota elogiosa para o Autor decorre da sua invulgar capacidade para analisar a actividade operacional da Marinha nos três teatros e para dela retirar conclusões úteis, só possíveis de identificar através de um aturado trabalho de pesquisa, servido por uma aguda inteligência e por invulgares conhecimentos operacionais.

Com este aflorar da qualidade do trabalho produzido pelo Prof. Cann apenas pretendi, muito elementarmente, demonstrar o que conduziu ao enorme apreço, à grande admiração e ao profundo sentimento de gratidão que tenho pelo Senhor Professor John Cann.

Ele é credor das nossas homenagens, das homenagens que também devemos àqueles que realizaram os feitos que ele descreve.


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