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Estado Democrático


 

É urgente democratizar o Estado, libertando-o de constrangimentos socialistas, mormente no que toca à sua dimensão social.

 

Manuel Braga da Cruz

Manuel Braga da Cruz

Professor Catedrático e antigo Reitor (2000-2012) da Universidade Católica Portuguesa. Membro do Conselho Editorial de Nova Cidadania

Estado DemocráticoO Estado democrático instaurado em Portugal é ainda, nalguns aspectos, filho da Revolução de 1975. As suas instituições foram, de início, profundamen- te moldadas pelo processo revolucionário. Muitas delas só se libertaram dessas marcas, após demoradas modificações políticas. As revisões constitucionais são disso exemplo. No entanto, a Constituição, promulgada em 1976, continua a indicar no preâmbulo que se propõe “abrir caminho para uma sociedade socialista”. Essa intenção tem aliás traduções várias no texto constitucional, que se con- substanciam na atribuição ao Estado de um poder de interven- ção excessivo na sociedade portuguesa.

É preciso libertar a sociedade portuguesa da desmedida tute- la do Estado, no sentido de proporcionar maior desenvolvimen- to da sociedade e da economia, e uma melhor justiça social. O socialismo, em democracia, é uma política partidária, e não um regime criador de uma sociedade socialista, que eliminaria o plu- ralismo e a democracia.

Ora é urgente democratizar o Estado, libertando-o de cons- trangimentos socialistas, mormente no que toca à sua dimensão social: a solidariedade social, a saúde e a educação. O Estado So- cial plasmado na Constituição portuguesa de 1976 inspirou-se nas constituições da República Democrática Alemã e da Jugoslá- via – como o afirmaram Gomes Canotilho e Vital Moreira na sua Constituição anotada - países socialistas que, em boa hora, desa- pareceram. O modelo de Estado Social que vigora em Portugal é um modelo socialista que precisa de ser democratizado, que tem de se abrir à liberdade na criação de estruturas de solidariedade social, na prestação de cuidados de saúde, na educação.

Há quem identifique o nosso modelo de Estado Social, com um pretenso modelo europeu de Estado Social. Ora não há um único modelo de Estado Social europeu. Desde logo porque não há na União Europeia políticas sociais comuns, mas antes uma pluralidade delas. Há vários modelos de Estado Social na Europa. O modelo britânico, escandinavo, ou francês têm di- ferenças assinaláveis. Criticar o actual Estado Social existente entre nós, e pretender a sua mudança, não é – como insiste a crítica socialista e comunista – ser contra o Estado Social Europeu, antes pelo contrá- rio, ao defender a variedade de soluções, constitui uma afirmação da pluralidade de- mocrática.

Todos sabemos que, em Portugal, não existe plena li- berdade de exercício da soli- dariedade social, nem plena liberdade de prestação e de recepção de cuidados de saú- de, nem plena liberdade de educação. A tolerância não configura uma liberdade, indissociável da diversidade e da leal concorrência entre prestadores. Em Portugal são conhecidas posições extremas que defendem o monopólio estatal da solidariedade so- cial, da saúde e da educação, invocando precisamente a Constituição, muito embora a Constituição o contrarie.

Acresce ainda que as ins- tituições públicas de solida- riedade social, de saúde e de educação tendem a centrar-se nos profissionais, enquanto as instituições privadas se centram nos sujeitos a quem prestam serviços.

Estado Democrático

Esta desmedida intervenção do Estado na sociedade tem vindo a agravar-se com a integração europeia, que fez do Estado o distribuidor dos fundos europeus, aumentando ainda mais a dependência dos cidadãos do Estado, o centralismo das decisões e dos investimentos. Temos um Estado demasiado extenso e centralizado, que concentra em si a grande parte dos fundos co- munitários, minimizando a importância da sociedade civil para o desenvolvimento nacional.

Do mesmo modo, são muitas as indicações de necessidade de alteração do sistema político português, nesse sentido de melho- rar e reforçar a democracia.

Na base do sistema político está o sistema eleitoral, cuja re- forma se reivindica de vários lados, há mais de 45 anos, sem su- cesso significativo. É a mais importante e fundamental reforma política que se impõe em Portugal, no sentido de empoderar os cidadãos, de os aproximar das instituições políticas, de fomentar a sua participação política, e diminuir o excessivo peso dos par- tidos políticos , que se tem vindo a espalhar por vários domínios da vida pública portuguesa.

Dessa reforma dependem outras reformas das instituições po- líticas, desde o sistema de governo ao sistema parlamentar, pas- sando pelo sistema de partidos, ambos devedores da transição re- volucionária, hoje demasiado distante e ultrapassada.

Para pensar uma reforma da democracia e do Estado em Portugal, no sentido de uma maior democracia e liberdade, é fundamental perceber as ori- gens e primeiros passos da instauração de ambos.

Temos um Estado demasiado extenso e centralizado, que concentra em si a grande parte dos fundos comunitários, minimizando a importância da sociedade civil

Os textos aqui reunidos, conferências feitas uns, ar- tigos redigidos e publicados outros, nas mais variadas cir- cunstâncias, pretendem con- tribuir para essa compreen- são, e para a indicação de rumos da necessária reforma política e social. Têm datas muito diversas e não repre- sentam qualquer sistematici- dade. No entanto, constituem parcelas de uma visão global sobre as origens e sobre as necessidades futuras de uma renovação do nosso Estado democrático.


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