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Tocqueville 2022 - Prémio Fé e Liberdade

Mário Pinto

Mário Pinto

Professor Catedrático Jubilado, Universidade Católica Portuguesa; Presidente do Conselho Editorial Nova Cidadania

Discurso pronunciado na sessão da entrega do Prémio Fé e Liberdade, em 17 de Fevereiro de 2022, atribuído pelo IEP-UCP ao Professor Jorge Miranda.

Magnífica Reitora da Universidade Católica, Prof.ª Isabel Gil, Senhor Director do IEP, Prof. João Carlos Espada, Senhor Prof. Jorge Miranda, Senhores Professores, Senhores Graduados do IEP, Senhores Alunos do IEP, Senhores Colaboradores, Senhoras e Senhores

1. Este é um dia para mim gratíssimo, em que o Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, sob a direcção do Prof. João Carlos Espada, com a superior aprovação da Magnífica Reitora da Universidade Católica, Prof.ª Isabel Gil, e sem dúvida com o aplauso de todos nós, aqui, e de tantos outros que cordialmente nos acompanham à distância, deseja, de modo solene, dignificar publicamente a pessoa e a vida do Prof. Doutor Jorge Manuel Moura Loureiro de Miranda, conferindo-lhe o Prémio Fé e Liberdade.

2. Este é um dia para mim gratíssimo, em que o Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, sob a direcção do Prof. João Carlos Espada, com a superior aprovação da Magnífica Reitora da Universidade Católica, Prof.ª Isabel Gil, e sem dúvida com o aplauso de todos nós, aqui, e de tantos outros que cordialmente nos acompanham à distância, deseja, de modo solene, dignificar publicamente a pessoa e a vida do Prof. Doutor Jorge Manuel Moura Loureiro de Miranda, conferindo-lhe o Prémio Fé e Liberdade.

O Prof. Jorge Miranda merece, portanto, que o seu nome conste entre as figuras dos mais ilustres universitários portugueses que, no século XX, por amor genuíno à única e multissecular história da Universidade no Ocidente cristão, sem renegarem em nada o seu amor à «universitas studiorum», lutaram generosamente pelas liberdades universitárias na fundação e no desenvolvimento de uma Universidade Católica em Portugal. E muitos outros foram, que agora injustamente não nomeio.

3. Mas, como comecei por dizer, a nossa intenção de hoje é especialmente distinguir o Prof. Jorge Miranda pela atribuição do Prémio Fé e Liberdade.

Fé, que é a pedra de toque do cristão; e liberdade, que é a pedra de toque da cidadania. Este é o problema axial da fé religiosa e da liberdade política dos crentes cristãos. Que se pretende exaltar, entre nós, reconhecendo-o, vivo e vivido naqueles que o resolveram exemplarmente. Hoje, na pessoa do Prof. Jorge Miranda.

4. A questão é funda e decisiva, bem o sabemos: e não só na vida pessoal de cada um, onde pede aos cristãos uma heroicidade de discernimento e de coerência, como também na vida social e política, onde o crente cristão frequentemente defronta dificuldades de vária ordem. Especialmente quando estas dificuldades são agudizadas pelos que pressupõem que uma certa razão das liberdades humanas não deve suportar a razão da fé. E por isso defendem discriminar negativamente a fé religiosa, na esfera pública das liberdades sociais, culturais e políticas, e remetê-la para a esfera restritamente privada. Numa secularização política da sociedade, que é dos homens livres e inteiros.

Apesar da feliz solução institucional do «princípio da separação entre a Igreja e os Estados», e da relativa paz que dela resulta, a questão ainda não morreu inteiramente, nas suas duas expressões; a filosófica e a ideológica.

É muito significativo que Papas do nosso tempo (e mil sábios de várias disciplinas) lhe tenham dedicado grande atenção. A este propósito, permitam-me que destaque dois exemplos marcantes: o do Papa João Paulo II, e o do Papa Bento XVI.

5. Na sua Encíclica — precisamente intitulada Fides et ratio, Fé e Razão, em que am- plamente versou este tema —, o Papa João Paulo II, que era doutor em filosofia e scholar eminente, definiu a relação entre a fé e a razão nesta imagem lapidar: «A fé e a razão constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade».

Esta epistemologia aberta, sem parti pris nem filosófico nem científico, é cordial e belíssima; e vem desde os princípios da Igreja, excelentemente tratada em Santo Agostinho, e depois em Santo Anselmo, que uniram a fé e o conhecimento racional na clássica formulação: «Intellige ut credas, crede ut intelligas». Traduzindo: compreende para crer; e crê para compreender.

A raiz desta interpretação encontra-se nos Evangelhos, quando Jesus Cristo perguntava aos discípulos, a quem queria ensinar na fé: «compreendeis o que vos digo?» S. Paulo, numa das suas Cartas, recomendou aos cristãos que estejam sempre prontos a dar as razões da sua fé.

6. Por mim, e se me é consentido opinar nesta magna questão, contento-me em pensar que a, por alguns, alegada contradição entre a fé e a liberdade-da-razão só seria lógica se a liberdade-da-razão fosse entendida como libertação da razão perante a realidade. Porque, como afirmou um dos maiores filósofos tomistas do século XX, o alemão Josef Pieper, a liberdade não é livre perante a realidade.

Com o que, obviamente, nós teremos de reconhecer, a menos que a liberdade queira ser um puro arbítrio subjectivo pós modernista, que então não mereceria consideração decisiva a ninguém, para além do próprio, e até nem do próprio.

Ora, sendo então forçoso concluir que a liberdade só vale se reconhecer a realidade, isso equivale a dizer que a liberdade não é livre de não procurar a verdade, porque a verdade é a realidade. A verdade só pode ser a realidade, porque de outro modo não seria verdade.

7. Que a verdade é realidade, encontro-o eu dito, na suprema expressão do poeta Antonio Machado, nestes três versos, que cito textualmente: «la verdad es lo que es / e sigue siendo verdad / aunque se piense al revés». A verdade é o que é / e continua a ser verdade / mesmo que se diga que não é.

Tocqueville 2022 - Prémio Fé e LiberdadeEsta definição insuperável teve ainda, do mesmo Antonio Machado, um reforço fulgurante de autêntica teoria do conhecimento, nestoutros versos: «el ojo no es ojo / porque tu lo veas / sino porque el te vê.» O olho não é olho / porque tu o vês, / mas sim porque é ele que te vê.

8. Quanto a uma outra voz, também segura como a da poesia, mas agora voz da filosofia e da mística, fico-me com Edith Stein e com Santa Teresa Benedita da Cruz, que como sabemos são uma só e mesma pessoa, martirizada no campo de concentração nazi de Auschwitz, envenenada numa câmara de gás. Com Edith Stein doutora em filosofia e destacada assistente de Edmund Husserl, que defendeu a fenomenologia como filosofia do realismo, da objectividade, da “Sachlichkeit”. E com Teresa Benedita da Cruz, santa carmelita e Doutora da Igreja. Porque ambas resumiram, a uma só voz, a questão da fé e da razão, nesta ideia: «Quem procura a verdade, procura Deus, quer o saiba, quer o não saiba» .

Pode haver melhor modo de dizer do que o destes dois génios humanos, Antonio Machado e Edith Stein/Teresa da Cruz, contra o materialismo, o positivismo, o subjectivismo, o relativismo, o niilismo, hoje tão banais entre nós?

Dos mais ilustres universitários portugueses que por amor genuíno lutaram pelas liberdades universitárias

9. Mas continuemos, sobre a questão filosófica e política da fé e da razão, agora com Josef Ratzinger e o Papa Bento XVI. Esta questão foi uma daquelas em que, ao longo de anos, ele mais insistiu.

Ainda antes da sua eleição papal, então cardeal Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Ratzinger comprometeu-se a fundo neste problema, no histórico debate com Habermas, em Janeiro de 2004, em Munique, a convite da Academia Católica da Baviera.

O debate tratou do tema, previamente acordado (e cito): «Os fundamentos morais pré-políticos de um Estado liberal».

A formulação deste tema derivou do chamado «paradoxo Böckenförde», que se tornou internacionalmente famoso, do eminente professor de direito constitucional Ernst-Wolfgang Böckenförde, que foi membro do Tribunal Constitucional alemão, e pode ser trauzido assim: «O Estado liberal secularizado depende de pressupostos normativos que ele próprio não pode garantir».

Nesse debate, de certo modo o cardeal Ratzinger surpreendeu pelo tom humilde como admitiu a dificuldade com que um certo novo mundo ocidental de hoje, reconhece na fé cristã, e em geral nas religiões, um caminho racional para o conhecimento da verdade. Mas, do mesmo passo, negou um optimismo orgulhoso à razão humana. E terminou por propor, em coincidência com o Papa João Paulo II, uma cooperação entre a fé e a razão, e aliás num âmbito universal de todas as religiões.

10. Pelo seu lado, creio que Habermas ainda foi mais surpreendente, porque manteve, nesse debate, a proposta que pouco antes tinha feito às sociedades secularizadas do nosso tempo: isto é (e cito textualmente), que escutem mais e melhor as mensagens das religiões. O que significa postular que o pensamento religioso é racional e valioso para a vida política.

Disse ele, nesse debate, expressamente o seguinte, que cito: «A neutralidade ideológica da autoridade estadual, que garante iguais liberdades éticas a todos os cidadãos, não é conciliável com a generalização política de uma visão laicista do mundo». E continuou imediatamente: «Os cidadãos laicos, na medida em que se apresentam como cidadãos do Estado, não têm, por princípio, a faculdade de negar um potencial de verdade às concepções religiosas do mundo; nem de contestar aos cidadãos crentes o direito de contribuírem para as discussões públicas na sua linguagem religiosa».

11. Esta declaração do mais ilustre último representante da Escola de Frankfurt — insuspeita de simpatias metafísicas — revela bem como são hoje anacrónicos os preconceitos do laicismo ideológico, que se aninha na proclamação superficial de que «o Estado é laico» — ou de que é «não-confessional» — fazendo uma confusão semântica que é preciso denunciar.

Por sinal, e bem, a nossa Constituição não diz expressamente em parte alguma que o Estado é laico. Donde, evidentemente, não se pode concluir que ele possa ser confessional. A única coisa que na Constituição se diz, no art. 43.º, é que «o ensino público não será confessional» — o que tem de se interpretar como proibição de ser confessional tanto como de ser anti-confessional, porque ser anti-confessional é ser confessional da anti-confessionalidade. Portanto, como obrigação de ser neutro, respeitador imparcial do pluralismo.

Mas, quando na linguagem corrente, se diz usualmente que o Estado é laico, o que as mais da vezes de facto se implica é laicizar ideologicamente a sociedade, pelo menos na importante esfera de vida e de acção social-política correspondente à chama- da esfera pública estatal.

12. Ora este raciocínio é um sofisma que induz num grave erro. Porque a função institucional do Estado — institucional, note-se bem, não inata, porque o Estado é uma instituição, e não um dado da natureza tal como as pessoas humanas e as sociedades humanas são —, é a da garantia da dignidade e dos direitos e deveres da pessoa humana, em que se inclui a garantia do direito de liberdade religiosa, aliás entre os mais melindrosos direitos humanos pessoais de liberdade, porque é um dos chamados direitos da personalidade humana, consensualmente proclamados pelo constitucionalismo moderno como intocáveis, porque todos íntima e inseparavelmente nucleares na dignidade da pessoa humana, designadamente na sua identidade pessoal, na sua liberdade de consciência e no seu direito ao desenvolvimento da personalidade humana — todos eles direitos expressamente garantidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na nossa Constituição como invioláveis.

Por isso, de acordo com o constitucionalismo, o Estado não pode ser constitucionalizado nem como Estado confessional nem como Estado laico. Porque esta alternativa é do exclusivo exercício do inato direito de liberdade religiosa da pessoa humana, direito este natural que o Esta- do institucional não tem. Com base na mesma razão por que não se pode dizer que o Estado é solteiro, só porque não pode contrair casamento.

O Estado é imparcial, porque deve garantir igualmente as liberdades religiosas dos crentes e dos laicos

O que sem dúvida se pode e deve dizer, é que o Estado é alheio à distinção entre crente e laico; ou que é «neutro», como se usa dizer na Jurisprudência alemã, que afirma o princípio da neutralidade do Estado: «das Prinzip staatlicher Neutralität».

E, melhor ainda do que neutro, seria dizer que o Estado é imparcial, porque ele deve garantir igualmente as liberdades religiosas dos crentes e dos laicos. Ficaria assim mais claro que o Estado não pode favorecer, nem pode desfavorecer, nem os crentes nem os laicos. Uns e outros, com as suas livres escolhas e convicções, podem participar pessoalmente, todos ao seu próprio modo, igualmente na inteira esfera pública, isto é, tanto na estrita esfera pública estatal, como na esfera civil que também é pública. Como disse o insuspeito Habermas: nem o Estado nem os leigos podem (e recito) «contestar aos cidadãos crentes o direito de contribuírem para as discussões públicas na sua linguagem religiosa».

13. É portanto absolutamente contraditório que, com base no constitucionalismo moderno, fundado na igual dignidade de todas as pessoas humanas e na igualdade dos seus direitos e deveres inatos e invioláveis, os cidadãos laicos, que não aceitam que a sua liberdade cívica sofra limitações morais religiosas, queiram impor aos outros cidadãos crentes uma limitação cívica às suas liberdades morais religiosas. Como se a liberdade religiosa dos que a exercem ao modo laico, fosse superior (e até excluísse da esfera pública) a liberdade religiosa dos outros, que a exercem ao modo religioso.

Tocqueville 2022 - Prémio Fé e LiberdadeMinhas Senhoras e meus Senhores, Caros Amigos:

14. Estas considerações, que pretendem recordar-nos o elevado significado do Prémio Fé e Liberdade, que penso poder constituir um mote do IEP da UCP, ofereço-as aqui liberalmente em homenagem ao Prof. Jorge Miranda; porque elas também são expressão do conforto que pessoalmente ele me inspira, na minha admiração atenta, companheira e amiga da sua extraordinária vida docente e cívica em defesa de um constitucionalismo de inspiração personalista, racional e cristã.

15. A este propósito, creio ser edificante privilegiar as suas próprias confissões públicas: de que escolherei dois breves excertos do livro que escreveu, e publicou em 2015, sobre as suas memórias da Assembleia Constituinte.

Aí se lê. «A minha era uma família enraizadamente católica, embora não sem diferentes vivências da fé e das práticas, e eu recebi a educação correspondente. Os anos de infância, em Braga, marcaram-me para o resto da vida; e a minha crença cristã foi determinante para as minhas convicções a favor da liberdade e da democracia».

E mais adiante, ainda: «No 4.º ano do liceu, tomei contacto com as revoluções americana e francesa; e deve ter sido nessa altura que li, pela primeira vez, uma Constituição; e que me atrevi a fazer um esboço ou projecto de texto desse tipo (um dos muitos que fui escrevendo ao longo dos anos e ia deitando fora, quando chegava a uma versão que considerava melhor). Entusiasmei-me com a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão e traduzi-a. E, mais tarde, a Declaração de Direitos da Virgínia. Nesse ano ou no 5.º ano, no Liceu Camões (que frequentei desde que vim de Braga a partir do primeiro ano) formei com outros colegas uma espécie de “academia”, para no intervalo das aulas, no pátio debaixo das árvores ou sentados nos bancos, falarmos sobre assuntos que nos interessavam como adolescentes e aos quais eu associava por vezes temas políticos».

16. Admiráveis confissões estas — permitam-me esta exclamação —, que a sua vida confirmou. Eu posso testemunhar pessoalmente que, entre todos os católicos das gerações universitá- rias dos anos 50 e 60, que tiveram na Assembleia Constituinte de 1975-1976 uma das suas melhores expressões de cultura social e política, embora reduzida em número de pessoas, Jorge Miranda tem um lugar destacado na primeira fila. Porque ele foi, inegavelmente, entre todos os constituintes, aquele que, com base na sua sólida preparação doutrinária cristã e política constitucional, se pode orgulhar de mais perfeitamente ter defendido, com denodo e com eficácia, uma constituição que, apesar de inicialmente compromissória, já tinha declaradas as suas raízes fundamentais no constitucionalismo personalista. Que aliás ele nunca mais cessou de querer aperfeiçoar. Neste sentido, Jorge Miranda foi, sem dúvida, entre os melhores deputados constituintes, o mais profético de todos eles. Por isso concordo com a sua nomeação como pai da Constituição. É muito de notar que ele tenha sido consensualmente escolhido como membro da Comissão Constitucional imediata à aprovação da Constituição, o que ao tempo correspondeu a ser eleito Juiz do Tribunal Constitucional.

Lembro ainda um episódio muito eloquente, que ele próprio recorda no seu livro de memórias. No auge da tentativa política de derrubar a Assembleia Constituinte, por iniciativa de partidos de extrema esquerda que alegavam estar a legitimidade revolucionária a ser posta em causa pela legitimidade eleitoral da Assembleia, foi tomada uma predisposição pelos partidos democráticos de mudar o funcionamento da Assembleia para o Porto. No termo de uma reunião reservada do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, o deputado socialista António Macedo, que era um experiente advogado portuense e uma das figuras mais veneradas nesse Grupo Parlamentar, veio convidar secretamente Jorge Miranda, pertencente a outro Grupo Parlamentar, a redigir um projecto de Declaração da Assembleia Constituinte nesse sentido. Esta escolha representou, sem dúvida, uma grande distinção interpartidária da sua competência como constitucionalista.

18. No seu recente manual sobre a Teoria da Constituição, que coroa em maturidade uma longuíssima e valiosíssima bibliografia jusconstitucional, internacionalmente reconhecida, Jorge Miranda comprova o sentido personalista, de raiz cristã, do seu histórico contributo teórico e prático para o que talvez se deva chamar neo-constitucionalismo universal.

Contributo histórico desde os seus primeiros ensaios pessoais; passando pela sua inovadora docência universitária, em que, ainda como simples assistente de Direito Constitucional, traduziu para os alunos e publicou todos os principais textos históricos de Declarações de Direitos Humanos; pela sua activa participação cívica, por exemplo na SEDES; pela sua marcante intervenção na Assembleia Constituinte; pela sua intervenção na Comissão Constitucional e nas primeiras sessões da nova Assembleia da República; pelas suas insistências nas sucessivas revisões constitucionais; sempre na procura de um constitucionalismo fundado na dignidade da pessoa humana ma segundo uma inspiração cristã.

19. É notável que Jorge Miranda tenha escolhido para tema da sua tese de doutoramento precisamente a Constituição de 1976, ainda quando ela era ainda compromissória entre o constitucionalismo de origem ocidental, universalizado na DUDH da ONU, e a outra concepção política oposta, tipicamente corporizada na Constituição e no regime político do socialismo soviético. Aí defendendo a sua pessoal concepção constitucional.

Contra outras vozes mais pessimistas, Jorge Miranda foi sempre um defensor desta inicial constituição compromissória, porque (entendia ele) ela era suficientemente fundamentada em princípios de raiz humanista ocidental, designadamente no princípio da dignidade da pessoa humana e dos seus direitos e deveres inatos e invioláveis, inscritos nos seus dois primeiros artigos. A história deu-lhe razão.

Sendo que, note-se bem, essa sua posição defensora do texto constitucional de 1976 esteve sempre unida a uma insatisfação quanto às contradições e imperfeições constitucionais. E por isso não cessou mais de intervir activamente nas suas revisões e com frequentes propostas de aperfeiçoamentos. Até ao seu mais recente livro, de Abril último, precisamente intitulado «Aperfeiçoar a Constituição».

20. Senhoras e Senhores, Caros Amigos.

Terminarei dizendo que é bom assim saborear, no exemplo de vida de Jorge Miranda, como é bela, gostosa e animosa a sabedoria cristã, quando lhe somos fiéis. E como é bom que, assim falando dela, possamos interessar os que ainda a não conhecem, ou a não saboreiam, ou a combatem. Porque se os cristãos de hoje se calarem, foi-nos profetizado por Jesus Cristo que, mais tarde, «gritarão as pedras».

21. Por tudo isto e o muito mais que, por incapacidade minha e limite de tempo não me coube dizer neste nosso memorável encontro, Caríssimo Prof. Jorge Miranda, meu Querido Amigo, creio que em nome de todos nós lhe poderei dar três agradecimentos:

Primeiro: gratos lhe somos, pelo seu exemplo;

Segundo: gratos por aceitar esta nossa homenagem de reconhecimento pelo seu amor à fé e à liberdade;

Terceiro: gratos por assim também honrar o nosso Prémio Fé e Liberdade.

Tenho dito. Agradeço a atenção que me dispensaram.


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